Num Dia de Domingo
Domingo costuma ser sinônimo de pausa: ruas mais vazias, despertadores ignorados, cafés da manhã preguiçosos. É o dia em que o mundo parece apertar o botão de “modo silencioso”. Ainda assim, foi exatamente nesse intervalo de quietude que nasceram algumas das empresas mais transformadoras do planeta.
Em 1º de janeiro de 1939 – um domingo de Ano-Novo – Bill Hewlett e Dave Packard selaram, num modesto garagem em Palo Alto, a parceria que deu origem à Hewlett-Packard. Sem clientes, sem pedigree e com apenas US$ 538, eles decidiram que aquele feriado era o momento certo para oficializar o sonho que inauguraria a era dos gadgets eletrônicos na Califórnia e, por extensão, o próprio Vale do Silício.
Mais de meio século depois, outro domingo seria palco de uma nova disrupção. No fim de semana do Labor Day de 1995, Pierre Omidyar terminou de escrever o código de um site de leilões online chamado AuctionWeb. Ele clicou em “publicar” no dia 3 de setembro, também um domingo. O experimento – inspirado nos hobbies da noiva e testado com a venda de um laser pointer quebrado – cresceria para se tornar o eBay, abrindo caminho para o comércio entre estranhos na internet.
Até mesmo a China, então à margem da bolha ponto-com ocidental, escolheu um domingo para dar seu salto. Em 4 de abril de 1999, Jack Ma reuniu 17 amigos no apartamento apertado em Hangzhou e, numa maratona de código e pitches improvisados, colocou no ar o Alibaba.com. A data marcou o primeiro capítulo de um grupo que, duas décadas depois, emprega centenas de milhares de pessoas e influencia metade do e-commerce global.
HP, eBay e Alibaba não tinham nada em comum além do cenário: um domingo em que a maioria descansava. Esse “oásis de silêncio” ofereceu espaço mental para imaginar o que não cabia nas agendas lotadas da semana. Em vez de acordar tarde, seus fundadores acordaram cedo; em vez de consumir o descanso, produziram futuro.
Há, portanto, algo de precioso na lassidão do domingo: a ausência de ruído externo que protege ideias frágeis no instante em que nascem. Quando todos reduzem a velocidade, quem decide acelerar encontra estradas vazias. Talvez seja essa a maior lição escondida nos calendários dessas empresas: a inovação não segue expediente, e o desejo de mudar as coisas ignora folgas coletivas.
Da próxima vez que o domingo chegar, lembre-se: o mundo adormece, mas as grandes viradas gostam de nascer no silêncio. Se a inquietação bater, pode ser justamente o sinal de que é hora de começar – ainda que o resto da cidade só desperte na segunda-feira.