Ulisses na Ilha de Ítaca
Ulisses foi o herói mais humano da mitologia. Não era o mais forte, nem o mais rápido. Mas era o mais sagaz. Foi ele quem teve a ideia do Cavalo de Tróia. E quando a guerra terminou, seu desejo era simples: voltar para casa.
Essa casa tinha nome: Ítaca. Uma ilha modesta, longe dos grandes centros, mas que representava tudo o que Ulisses amava — sua esposa Penélope, seu filho Telêmaco, sua identidade como rei, pai, homem.
O que se seguiu foi uma jornada de dez anos. Tempestades. Gigantes. Sereias. Deuses. Dúvidas. Ulisses foi testado por tudo e por todos. Mas no fundo, seu maior teste era resistir à tentação de desistir.
Porque o mundo lá fora oferecia distrações. Oferecia conforto, poder, prazer. Mas nada daquilo era dele. Nada daquilo era casa. Ítaca era o lugar que fazia sentido. E mais que isso: era o lugar onde ele lembrava quem ele era.
Avançando alguns milênios, seguimos navegando — só que em mares diferentes. Hoje, nossas batalhas são contra algoritmos, expectativas sociais, pressões financeiras, jornadas exaustivas, crises de identidade. Estamos sempre conectados, mas muitas vezes distantes de nós mesmos.
O tempo passa. As metas mudam. As cidades nos engolem. Os dias viram meses sem que a gente pare para se perguntar: eu ainda estou indo na direção da minha Ítaca? Ou já me acostumei com a deriva?
Ítaca, hoje, pode ser muitas coisas. Um propósito profissional. Um estilo de vida. Uma cidade onde você se sente inteiro. Uma rotina que te nutre. Pessoas que te reconhecem. Pode ser até você mesmo, reencontrado depois de tanto se moldar para caber em moldes que não eram seus.
Mas tem uma regra: só você pode saber qual é a sua Ítaca.
Ulisses não voltou porque o mar ficou calmo. Ele voltou porque nunca esqueceu o que o movia. E talvez seja essa a maior lição: encontrar seu lugar no mundo não é um luxo — é uma necessidade vital. É só a partir desse lugar que você cria, inspira, transforma.
Afinal, quem não sabe para onde está voltando, pode passar a vida toda indo embora de si mesmo.
Seus textos são sempre impecáveis e inspiradores.
Excelente, adorei o texto! Obrigada pela reflexão. Um grande abraço!